28 dez Ao nascer o menino lança um grito
Publico um poema sobre portas, nesse final de 2016: ano duro, fechado às esperanças, escancarado à corrupção e à descrença, em que o abismo entre as classes sociais brasileiras se aprofundou, revelando-se intransponível pela insensibilidade dos que se mantêm no poder ou no controle da riqueza, sem nunca alterar o modelo sacramentado desde os tempos do Brasil colônia.
Um poema contra os muros levantados para interditar o trânsito das pessoas, em migrações fugindo da guerra, da violência e da miséria.
Um martelo agalopado ao estilo dos repentistas nordestinos, escrito para o Auto das Portas do Céu, peça teatral em parceria com Assis Lima e Everardo Norões, e que decidi incluir na encenação do Baile do Menino Deus.
Dedicado hoje à população civil de Aleppo, na Síria, vítima de um genocídio sobre o qual muitos preferem silenciar.
Ao nascer o menino lança um grito
Com a força de todo o seu pulmão
Estremece de medo o coração
À procura da Porta do Infinito.
Depois, vê tudo falso e esquisito
As portas se trancando de repente:
O vinho se transforma em aguardente,
Uma nuvem escurece o Firmamento.
E assim, não me sai do pensamento
Tanta porta fechada à nossa frente…Tem, todo ser humano, nesta vida
Dentro dele uma Porta bem fechada.
A dor é como o fio de uma espada
Abrindo em nossa alma uma ferida,
É a falta da Terra Prometida,
A desgraça de Adão pela Serpente;
O gozo a transformar-se, em nossa mente,
Em tristeza, saudade e desalento.
Por isso não me sai do pensamento
Tanta porta fechada à nossa frente…De um mundo sem Porta, ando à procura.
Para a Porta sem Porta, sigo adiante.
Na minha estrada busco, confiante,
Uma luz que alumie a Noite Escura;
Nos ermos do Sertão, minha ventura,
Como barco que voga, e de repente,
Vê na onda que passa, livremente,
O segredo do Mar em movimento.
Vai se abrir com o poder do Pensamento,
Essa Porta fechada à nossa frente.
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