Compram bolsas Louis Vuitton e não compram livros | Ronaldo Correia de Brito | site oficial
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Compram bolsas Louis Vuitton e não compram livros

Sobrevoando as terras dos municípios de Juazeiro da Bahia e Petrolina, avistamos o deserto sertanejo, cinza e marrom na estiagem. E, no meio da secura, as águas do São Francisco e os plantios irrigados. Na caatinga rala, os círculos, triângulos, trapézios e retângulos verdes lembram,pintura abstrata. De perto, são cultivos de manga, uva, caju, feijão, milho e coco, uma agricultura próspera graças à melhor tecnologia e à generosidade do Velho Chico, de quem muito se tira sem dar nada em troca.

É belíssimo o remanso d’água entre as duas cidades, parece um lago. Os pernambucanos atravessam a ponte e olham Petrolina de Juazeiro, achando-a mais bonita. Os baianos fazem a mesma travessia e acham o contrário. De qualquer ângulo, há beleza de sobra, as cidades que crescem ao lado das águas são sempre mais belas. Imaginem quando existiam as matas ciliares, o rio tinha um caudal extenso e as embarcações ligavam as cidades, transportando mercadorias e gente. Embora se fale tanto em preservação e reflorestamento, um condomínio de ricos cresce à margem do rio, em área destinada ao replantio de árvores nativas.

É o Brasil dos ricos e pobres infratores, da bancada ruralista e o do código florestal que favorece o desmatamento. Chamam esse pedaço de Pernambuco e Bahia, encravado no sertão, de Califórnia Brasileira. A uva e o vinho produzidos já ganha apreciadores. Pode-se fazer um tour pelos vinhedos, degustar as bebidas, comprá-las, igualzinho se faz na Califórnia.

Juazeiro e Petrolina possuem meio milhão de habitantes, universidades, várias faculdades, excelentes restaurantes e cerca de mil bares, dizem. Aposto que é intriga, porque isso daria a média de um bar para quinhentas pessoas.

Há um ponto em que as duas cidades não parecem nada com a Califórnia: nelas quase não existem livrarias. Bem diferente de Berkeley, com sua biblioteca de milhões de exemplares e livrarias por todos os cantos. Dá para acreditar na dura verdade sobre Juazeiro e Petrolina? Como o apóstolo Tomé, eu acreditei porque vi a chaga dessa tristeza. Os milhares de estudantes e seus familiares têm poucos espaços sagrados onde podem folhear livros e fazer descobertas ao acaso. Compram na Internet, quase sempre por indicação dos professores, o que nunca é a mesma coisa de andar entre estantes, deixando-se seduzir por capas, ouvindo conversas de outros leitores. Essa realidade nos humilha e envergonha. Põe em cheque se algum dia nós alcançaremos a excelência na educação.

Uma única livraria e dois sebos resistem em meio ao deserto das letras, parecendo pés de juazeiro verdejante em ano de seca: SBS, Rebuliço e Kanaã. O grave pecado lembra a história bíblica de quando Iahweh resolveu destruir Sodoma e Abrahão intercedeu por ela. Começou alegando que talvez morassem cinquenta justos na cidade, que não mereciam perecer. O Senhor prometeu que perdoaria a cidade se Abrahão encontrasse os tais justos. A apelação do suplicante continua, até que o número é reduzido para dez. O resultado vocês conhecem. Os dez justos não são achados e Iahweh faz chover enxofre e fogo sobre Sodoma.

Não existem mais deuses com essa virulência nem é preciso tamanho castigo. Juazeiro e Petrolina são iguais às outras cidades brasileiras onde faltam livrarias, bibliotecas, teatros e cinemas, principalmente no norte, nordeste e centro-oeste. É incompreensível que proliferem universidades e faculdades, se não há o suporte de livros e boas bibliotecas. Os estudantes e as pessoas comuns, mesmo as mais ricas, não se educaram a consumir esse bem de cultura. Alegam que eles custam caro e que escasseia o dinheiro. Mesmo que ele nunca falte para a cerveja, o celular novo ou para a bolsa Louis Vuitton.

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