07 abr Diário do isolamento 2
(Terça-feira, 07 de abril)
Uns amigos me telefonaram bem cedo, preocupados com a reunião do presidente com seus ministros, no final da tarde. Até isso nos ocupa?, pensei chateado. Havia risco do ministro da saúde ser demitido. Por conta das posturas assumidas na pandemia, alçaram Mandetta, um conservador e ex-deputado do DEM, ao pódio dos heróis. Ele defende o isolamento horizontal, para todos. Bolsonaro insiste no isolamento vertical, apenas para grupos de risco, pessoas acima de 60 anos, portadores de diabetes, doenças cardíacas e pulmonares, hipertensão, imunodeprimidos, etc.
Somos um país à procura de heróis. Os mais recentes foram Moro, bastante eclipsado pelo coronavírus, e Bolsonaro, o mito, como gritam os fanáticos por onde ele passa. No dicionário Houaiss, o sexto verbete sobre o significado de mito o define como “construção mental de algo idealizado, sem comprovação prática; ideia, estereótipo”. Acho bem adequado ao nosso presidente. E a muitos outros que caíram no esquecimento, deixando atrás de si um lastro de mazelas.
Mandetta revelou firmeza no alinhamento com as recomendações da OMS. Titubeou durante alguns dias, quis recuar quanto ao rigor da quarentena, atacou a imprensa, mas voltou atrás e pediu desculpas. Médico ortopedista, sem formação em saúde pública, entrou na política para defender a causa dos profissionais de saúde e dos ruralistas do seu estado, Mato Grosso do Sul. Opositor do programa Mais Médicos, que levou médicos para os interiores do Brasil, sobretudo cubanos. A falta deixada nunca foi preenchida e as populações continuam sem assistência. Mandetta também foi apoiado pelos planos de saúde, sobretudo a UNIMED, da qual foi presidente em Campo Grande, e pela Associação Médica Brasileira. No governo Bolsonaro, deu-se continuidade ao desmonte do Sistema Único de Saúde, iniciado com Temer, com o corte de verbas e investimentos. O mesmo SUS que tentam salvar às pressas, pois se trata da única garantia de assistência às populações carentes.
Um carro de som da prefeitura do Recife pede às pessoas para ficarem em casa. Hoje completo 22 dias de isolamento. Leio, ouço música, vejo filmes, faço ginástica e, com minha esposa, tocamos o trabalho que era feito por dois funcionários. Eles estão de quarentena, como nós. Precisamos cumprir uma rotina de monges, para amenizar os danos do confinamento. Há muitos pássaros e galos cantando em volta do prédio. Vemos belos por de sol e a lua cheia invadiu a casa. Pensei em recuperar esses dias perdidos. Tolice. Cada dia é único.
Marilia
Posted at 12:44h, 07 abrilAplausos pelo texto de muita sensibilidade. Fique em casa. Aproveite tem tanta coisa para fazer e também olhar a volta dos animais. Muita poesia e encantamento.