A escolha entre envelhecer ou virar morto vivo | Ronaldo Correia de Brito | site oficial
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A escolha entre envelhecer ou virar morto vivo

Percebo a passagem do tempo no modo como as pessoas mais jovens me tratam. Meu nome vem precedido do respeitoso senhor e outras vezes do abominável tio, essa invenção das escolas americanas que se alastrou no Brasil feito praga. As sociedades antigas possuíam ritos de passagem para várias idades e envelhecer era um percurso natural. Ninguém tentava escamotear o tempo.

Inventaram um eufemismo para as pessoas que ultrapassam os 60 anos: terceira idade. Não quero a terceira idade, prefiro envelhecer de verdade, ser um velho. Também não vou fingir uma vitalidade que já não possuo, me exibindo em festinhas e joguinhos da terceira idade, como se fosse um macaco de circo. Desculpem, esqueci que os animais estão proibidos nos circos.

As pessoas buscam a juventude perene através da reposição de hormônios, da ingesta de dezenas de vitaminas e sais minerais, de botox, silicone, implante de cabelos e cirurgias plásticas. Quando existiam novelas de tv, eu percebia o resultado desse esforço: um desfile de rostos teratológicos, sem expressão e sem mímica facial, deformados pela repetida ação do clostridium tetânico e do bisturi dos cirurgiões.

O isolamento por conta da pandemia envelheceu as pessoas e muitas delas ficaram com os nervos arruinados. Apenas no futuro vamos avaliar os danos causados às crianças. Os idosos foram as vítimas preferenciais da Covid 19, a Onça Caetana de que falava Ariano Suassuna.

Os egípcios se mumificavam acreditando que levariam o corpo para uma vida no além. Muitos se transformam em múmias nessa vida de cá. Nada contra os cuidados com o corpo. A ginástica, uma alimentação saudável, a mente bem exercitada, o convívio com amigos e familiares, ocupação e um projeto de vida são essenciais para envelhecer com saúde.

Sei que vão me execrar. Mas o culto exagerado à beleza e à juventude é expressão do medo de morrer, uma resposta à ansiedade pânico e à depressão do século XXI, agravada durante a pandemia.

Tentamos nos eternizar trocando ombros, joelhos, peitos, bundas, cabelos, pele. E quando alguém parece ter chegado ao fim, no ponto em que o mais digno e justo seria morrer, é arrastado para dentro de uma terapia intensiva, onde teimam em mantê-lo vivo.

Bater o coração e respirar através de máquinas significa estar vivo?

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