12 dez Onde está a neve?
O que faz o Baile do Menino Deus ser único na cena natalina brasileira é o seu projeto de resgatar várias formas de celebração do Natal, que sobreviveram e se guardaram apenas no Nordeste do Brasil. Reisado, lapinha, pastoril, cavalo marinho, guerreiro, chegança, boi de reis, quem ainda menciona ou representa essas brincadeiras de tradição ibérica, do trovadorismo francês e italiano? O Natal se tornou monotonamente “congelado” com neve de isopor, pinheiros, renas, trenós e Papai Noel. Os shoppings passaram a ditar a moda, a imprimir um gosto nos brasileiros que reproduz a cultura americana, do leste europeu e do consumo. Ou carnavalizou-se em desfiles de alegorias com o nome de “Natal Luz”.
O Baile do Menino Deus não se envergonha de afirmar que o Natal comemora um nascimento divino, o do Menino Jesus. E com ele celebrar o sagrado, José e Maria. Sem ser um espetáculo religioso, sem professar o credo de qualquer Igreja, na contramão do mercado e do consumo, a encenação aposta em valores da tradição milenar de vários povos do mundo. O resultado é um espetáculo contemporâneo, ousado, não folclorizante, que também aborda questões do homem moderno como as migrações, o exílio, a desigualdade social e o preconceito. Tudo narrado de modo lúdico, através de excelente música, bela poesia, danças e representações.
Em 35 anos de existência como livro, disco e peça teatral, 15 anos de montagem na Praça do Marco Zero, no Recife, Pernambuco, oBaile do Menino Deus se transformou numa escola, num modelo de fazer teatro que se reproduz por todo o Brasil. Centenas de encenações acontecem de cidades pequenas a cidades como São Paulo.
Em escolas públicas ou privadas, ricas ou pobres, ONGS, comunidades, abrigos, creches, presídios, assentamentos, tribos indígenas, quilombos, em grandes e pequenos palcos o Baile do Menino Deus se multiplica com sua dramaturgia construída sobre o tema de abrir uma porta e celebrar um nascimento.
“De um mundo sem portas ando à procura, para a porta sem porta sigo adiante”, declama o personagem Mateus, condutor da brincadeira. E, no final, diz os versos que se tornaram o símbolo dessa história única: “… o baile aqui não termina / o baile aqui principia / do mesmo jeito que o sol / se renova a cada dia / da mesma forma que a lua / quatro vezes se recria / do mesmo tanto que a estrela / repassa a rota e nos guia.”
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