22 fev A nova previdência de Bolsonaro pode aumentar nossa pobreza
Há um livro de fotografias de Christiano Jr. com imagens de escravos brasileiros do século XIX. Copiados num tom sépia, os retratos expõem homens e mulheres negros, a maioria ocupada em algum ofício. O status da escravidão são os pés descalços, explícitos e imorais, mesmo quando alguns cativos vestem trajes decentes. Boa parte dos retratados usa andrajos, molambos e remendos, que ofendem bem mais do que a nudez natural da vida em tribo.
As fotografias de Cristiano Jr. Possuem o mesmo caráter antropológico das pinturas e aquarelas de Debret, Rugendas, Guillobel, Pallière e Eckhout. Mas as cores da palheta quase sempre amenizam a tristeza, a miséria e a degradação do cativeiro, tornando artificial e folclórica a dura realidade. Nos muitos retratos de brasileiros, mesmo nos de Pierre Verger, onde sobressai um olhar amoroso pelos negros e mestiços do Brasil, o real se camufla menos, revelando-se na sua crueza.
A nossa história, que não é ensinada nas escolas, ou é falsamente ensinada, omite que os índios, mesmo contrariando leis da corte portuguesa e a proteção dos jesuítas, foram escravizados até início do século XVIII. E que a transição para a escravidão africana, nas capitanias do Norte como a do Pará e Maranhão, se deu já no início do século XIX. A maioria dos brasileiros é mestiça, garante o IBGE, descendemos de negros e índios que foram escravizados por brancos, numericamente inferiores, em nome do desenvolvimento e da riqueza, do interesse de investidores europeus.
Depois de 1888, quando supostamente teria sido abolida a escravidão, quase nada foi feito para reparar os danos infringidos à população de trabalhadores forçados e seus descendentes. Os ricos e herdeiros continuaram aferrados à riqueza acumulada pelo sacrifício, perda de liberdade e miséria de muitos. Nada aceitam partilhar. Governos como o de Getúlio Vargas, Lula e Dilma, que olharam para essa maioria de desvalidos e criaram políticas de promoção dos mais pobres, se tornaram ameaça aos colonizadores internos e externos, que promoveram suas quedas.
É preciso estar atento ao projeto de reforma da Previdência de Jair Bolsonaro. Ele pode aumentar o abismo entre as classes sociais no Brasil, tornando mais impossível uma indenização aos que foram lesados durante séculos. De nada terá valido o brado do poeta Castro Alves, se não continuarmos a luta contra as novas formas da escravização, o Dragão da economia ultra liberal e mundial.
Existe um povo que a bandeira empresta
P’ra cobrir tanta infâmia e cobardia! …
E deixa-a transformar-se nessa festa
Em manto impuro de bacante fria! …
Meu Deus! meu Deus! mas que bandeira é esta,
Que impudente na gávea tripudia?
Silêncio. Musa… chora, e chora tanto
Que o pavilhão se lave no teu pranto! …
Auriverde pendão de minha terra,
Que a brisa do Brasil beija e balança,
Estandarte que a luz do sol encerra
E as promessas divinas da esperança…
Tu que, da liberdade após a guerra,
Foste hasteado dos heróis na lança
Antes te houvessem roto na batalha,
Que servires a um povo de mortalha!…
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