24 mar Matamoro!
Calma, calma, não se precipite! Nada de ilações.
Sim, no próximo domingo terá início a Páscoa. Cristãos celebram a entrada do Cordeiro de Deus em Jerusalém, montado num burrico, em meio à multidão agitando ramos de oliveira.
Depois virá a Paixão (quando Jesus se transforma de exaltado em crucificado), na sexta-feira. Do sábado para o domingo, a Ressurreição. Mas já no sábado, quando o Cristo mal entregou a alma ao Pai, começa a pândega: a matança ou malhação do Judas, o castigo para o traidor.
Representado por um boneco em tamanho natural, parecido com as réplicas que a turba brasileira exibia em passeatas recentes, o Judas desfila ao som de bandas, a caminho da execução em praça pública. A cabeça de estopim do simulacro explode. A multidão se atira ao corpo recheado de palha e molambos, e o dilacera.
Aos gritos de “traidor do povo”, “vendido ao Império Romano (numa atualização diriam ‘vendido ao império americano’)”, “bandido” e por aí afora.
Deslizei lacanianamente para Matamoro, tipo valentão, ferrabrás, falso herói, personagem da commedia dell’arte, poltrão que ocupa “o terceiro vértice do triângulo satírico do poder”, na commedia. Os outros dois poderosos são Pantaleón, no vértice econômico e Dottore, no vértice intelectual (a imprensa, por exemplo). Matamoro é capitão do exército e representante das forças armadas.
A commedia dell’arte, o mais popular teatro europeu, no qual se inspiraram Molière e Goldoni para criarem suas peças, tem um esquema básico de divisão de personagens em servos, patrões e amantes. Os patrões representam o poder, como relatei acima, e o Capitão Matamoro faz mil trapaças para conseguir um posto de mandão.
Matamoro!
Agora que a Semana Santa se aproxima, imagino os gritos da turba mandando executar o Judas. Ao ouvir o panelaço de ontem, com gritos de “fora”, “genocida”, “traidor”, no dia em que o Supremo decidiu pela suspeição de Moro, também por deslizamento saí do falso ex-juiz Moro para o biltre Capitão Matamoro.
E sofri delírios e fantasias.
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