Ronaldo Correia de Brito é escritor e médico, nasceu em Saboeiro, Ceará, em 2 de julho de 1951.
Foi escritor residente da Universidade de Berkley (Califórnia), participou de diversos eventos internacionais, como a Feira do Livro de Bogotá, o Festival Internacional de Literatura de Buenos Aires, o Salon du Livre de Paris e a Feira do Livro de Frankfurt. Sua carreira artística envolve as mais diferentes linguagens, como literatura, teatro e música. São de sua autoria O baile do menino deus (teatro), Lua Cambará (disco), Faca (livro de contos), Galiléia (Prêmio São Paulo de Literatura), Estive lá fora (romance) e O amor das sombras (contos).
Ronaldo Correia de Brito nasceu na fazenda Lajedo, município de Saboeiro – Ceará, sertão dos Inhamuns, em 1 de outubro de 1950. Era nove horas de uma manhã de domingo, seu pai João Leandro saiu ao terreiro e deu um tiro de espingarda para cima, anunciando as alvíssaras. Quando a família levou a criança para ser batizada, na igrejinha colonial de Saboeiro, o padre redentorista alemão confundiu o nome ‘Ronaldo’ com ‘Runwald’ – de origem druida, usado para designar o feiticeiro que joga as runas – e recusou-se a batizar a criança dizendo tratar-se de um nome pagão. A família, às pressas, escolheu o nome ‘José’, porque o bebê nascera laçado pelo cordão umbilical e chamar-se ‘José’ seria o sortilégio que o livraria de morrer afogado. A confusão não terminou aí. Contrariado com a recusa do padre, o pai decidiu registrá-lo ‘Ronaldo’, esquecendo o ‘José’ do batismo. O tabelião do cartório havia bebido em excesso naquele dia e escreveu no registro a data 2 de julho de 1951, o que só foi descoberto anos depois e nunca corrigido. Com dois nomes e duas datas de nascimento, Ronaldo escolheu chamar-se Ronaldo e teve de assumir, por motivos burocráticos, o 2 de julho de 1951.
Ritinha Brito, a mãe, nascera no Crato, na região do Cariri, cidade cercada pela Chapada do Araripe, com floresta atlântica e centenas de nascentes d’água, o oposto do árido sertão dos Inhamuns, cortado pelo rio Jaguaribe, um rio seco que enche apenas durante a estação das chuvas. A família do pai e da mãe viera de Pernambuco, no final do século XVII, parte dela ficou em Saboeiro, alguns fundaram a cidade de Várzea Alegre e outros seguiram para o Crato. Muitos tinham ascendência de cristãos novos, judeus sefarditas batizados de pé para escapar à Inquisição, em Portugal. O ofício de professora levou Ritinha Brito ao Rosário, onde conheceu o aluno João Leandro, filho dos donos da propriedade. Os dois se apaixonaram, se casaram, e receberam a fazenda Lajedo para morar e administrar.
Entre os poucos pertences da jovem esposa, o mais valioso era um caixote com gramáticas, livros de aritmética, modestas antologias e uma seleta de textos bíblicos do antigo e novo testamento, muito popular nas casas cearenses: A História Sagrada. Os livros de matemática e português serviram aos estudos de João Leandro. Em narrativas como a de José do Egito e seus irmãos, Ronaldo aprendeu a ler e a confundir os pastores sertanejos com os hebreus. A Bíblia sempre representou para ele o mais extraordinário livro de contos e iria marcá-lo por toda vida.
Na fazenda Lajedo nasceram cinco irmãos, desses, dois morreram bem cedo. Quando os pais reconheceram que não havia mais futuro no campo, mudaram-se para o Crato. O ano era 1955, e o menino acabara de completar cinco anos. Na cidade, a segunda maior do Ceará, ele estudou até a terceira série primária no Grupo Escolar Francisco José de Brito e depois se transferiu para o Colégio Diocesano, onde ficou até o segundo ano científico.
No Crato, Ronaldo assiste aos espetáculos populares – reisados, lapinhas, pastoris, bandas cabaçais, dramas de calçada – e frequenta as festas da Igreja, ricas em representações, verdadeiros autos sacramentais. Ele credita às experiências com as brincadeiras de rua e as celebrações religiosas o seu gosto pelo teatro e a sua formação dramatúrgica. O hábito de ouvir histórias da tradição universal, das mitologias locais, e histórias familiares narradas por diferentes pessoas como a avó materna, a mãe, o pai e os tios, contadas por homens e mulheres que ao modo dos “griots” da África Central perambulavam por fazendas e engenhos, entretendo as pessoas com seu repertório de narrativas, marcou profundamente o futuro escritor.
Num universo pobre de livros e leitores as bibliotecas da diocese, de um primo letrado e da Faculdade de Filosofia representaram a chance de ter acesso ao conhecimento escrito. Quando saiu do Crato para morar no Recife, já havia lido quase toda obra de Machado de Assis, José de Alencar e Monteiro Lobato, e clássicos como Homero, Shakespeare, Balzac, Dostoievski, Tolstoi, Ésquilo, Sófocles, Eurípides e as narrativas da Bíblia. E também via o que passava nos cinemas, sem crítica nem critérios, das chanchadas da Atlântida aos clássicos americanos de John Huston e John Ford, e até diretores europeus famosos como Pasolini, Visconti e Godard.
Em 1969, quando chegou ao Recife para o cursinho pré-vestibular de medicina, vivia-se o auge da repressão militar. Nesse ano foi assassinado o Padre Henrique Pereira e baleado o líder estudantil da Faculdade de Engenharia, Cândido Pinto. Em meio ao terror, o Recife mostrava a beleza de sua arquitetura variada, os rios e as pontes, causando forte impressão no jovem estudante. Camus havia comparado a cidade a Florença e o poeta João Cabral a achava parecida com Sevilha. Ronaldo reencontrou um colega do Crato, Francisco Assis de Sousa Lima, com quem já ensaiara um experimento no teatro, e ele se tornaria seu futuro parceiro de pesquisas e criações.
Classificados no vestibular, os dois se matriculam na Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Pernambuco, no ano de 1970. No segundo semestre desse ano vão morar na Casa do Estudante Universitário e dividem quarto com o poeta Ângelo Monteiro, de quem se tornam grandes amigos. Graças a Ângelo, frequentam o Departamento de Extensão Cultural da Universidade (DEC), dirigido por Ariano Suassuna, que acabara de fundar o Movimento Armorial. Pelo DEC circulavam os mais importantes intelectuais pernambucanos: escritores, poetas, artistas plásticos e músicos. Apesar de muito jovem, Ronaldo é aceito nas rodas de conversas e frequenta espetáculos teatrais, concertos e exposições. Alguns anos mais tarde, ele e Assis Lima farão uma duradoura parceria com o músico Antonio Madureira, do Quinteto Armorial, mesmo não sendo filiados a esse movimento. Numa tarde desse mesmo ano de 70, ele lê para Ângelo Monteiro, Assis Lima e uma pequena platéia da Casa, o primeiro esboço do conto Lua Cambará.
Esse conto tosco seria o ponto de partida para a criação de um roteiro e a realização do primeiro longa-metragem na bitola super-8, rodado e montado nos anos de 1975, 76 e 77, em parceria com Assis Lima e Horácio Carelli Mendes, com música de Antonio Madureira, numa aventura típica da década. Ao estilo do neo-realismo italiano, os atores não eram profissionais. Avelina Brandão, que vive o papel principal na película, era uma jovem médica, namorada de Ronaldo, que fora acompanhar as filmagens e terminou sendo convocada para atuar. A cópia em super-8 foi transcrita para ‘Betacam’ e mostrada na televisão. Graças a isso o professor da USP Davi Arrigucci Jr. viu o filme, escreveu sobre o mesmo, e mais tarde teve um papel significativo ao lançar Ronaldo como escritor.
Lua Cambará ganhou uma versão musical, composta por Antonio Madureira, duas versões para balé e uma nova versão para o cinema, dirigida por Rosemberg Cariry.
No começo da década de 1980, em conversa com os amigos Assis e Zoca (Antonio Madureira) acharam que as festas de Natal, São João e Carnaval precisavam de dramaturgia e música à altura das celebrações populares nordestinas. Zoca brincava dizendo que os filhos cresceriam vendo apenas as decorações dos shoppings e escutando tocar o Jingle Bells. Em 1983 eles lançam um disco pelo selo Eldorado – Baile do Menino Deus – e estréiam uma peça com o mesmo nome. Antes de sair a segunda ‘festa’ da trilogia, eles aprontam, em 1985, o disco O Pavão Misterioso e estréiam uma peça de mesmo nome. É a adaptação de um famoso cordel, e teve a parceria de Antonio Carlos Nóbrega. Em 1987, no mesmo esquema de gravação de um disco e estréia de uma peça teatral, sai Bandeira de São João e, em 1989, Arlequim.
Baile do Menino Deus faz grande sucesso no Recife e torna-se conhecido e encenado no restante do Brasil. Uma edição da Objetiva para o Programa Nacional Biblioteca Escolar, ganhou tiragem de quase meio milhão de livrinhos. A Editora Bagaço, do Recife, publica a partir de 1996 as três peças da trilogia, adaptadas para prosa. A versão de O Pavão Misterioso sai pela Cosacnaify, em 2004, ano em que o Baile do Menino Deus, no formato de cantata natalina, estréia na Praça do Marco Zero, no Recife, onde está em cartaz há 10 anos, sempre nos dias 23, 24 e 25 de dezembro, tornando-se uma grande festa natalina da cidade, do estado e do nordeste.
Embora escrevesse contos e se considerasse um contista, Ronaldo publica sua primeira coletânea apenas em 1987: As noites e os dias – Editora Bagaço. Anos depois ele envia um exemplar desse ‘livrinho magro’ ao professor e crítico Davi Arrigucci Jr., que o indica à editora Cosacnaify. Graças a esse empurrão e aos cuidados editoriais de Rodrigo Lacerda e Augusto Massi, sai publicado Faca, em 2003. Em 10 anos, as gavetas se abrem e Ronaldo expõe o que escondia: Pela editora Cosacnaify: O Pavão misterioso, 2004, em parceria com Assis Lima; Livro dos Homens, 2005. Pela Editora Alfaguara: Galileia, 2008, que ganhou o Prêmio São Paulo de Literatura – Melhor livro do Ano; Retratos imorais – contos –, 2010; Arlequim de Carnaval, 2011 e Bandeira de São João, 2012, em parceria com Assis Lima; e o romance Estive lá fora, 2012. Pela Editora Objetiva publica, em 2011, Baile do Menino Deus, também em parceria com Assis Lima, e o livro Crônicas para ler na escola.
A convite do jornalista Mário Hélio, a partir de dezembro de 2000 passa a assinar a coluna Entremez, na revista Continente. Mais tarde, colabora semanalmente com revista Terra Magazine, do Portal Terra, editada por Bob Fernandes e, anos depois, torna-se colunista quinzenal do jornal O Povo, publicado no Ceará. Colabora em diversos jornais e revistas do Brasil com resenhas de livros, ensaios, crônicas e contos.
Enquanto trabalha a prosa, escreve e encena diversos textos teatrais. Os contos são adaptados para o teatro e o cinema. A partir do êxito alcançado pelo romance Galileia, começam as traduções de seus livros, os convites para palestras, entrevistas, viagens ao exterior. Nesse tempo, como o também médico e escritor Tchekhov, busca um equilíbrio entre o exercício da literatura e da medicina.
Sinopse: A cada livro, Ronaldo Correia de Brito expande os limites de sua ficção, e da própria literatura brasileira. Já no primeiro conto, duas irmãs velhas estão presas a uma casa antiga e se recordam de tragédias passadas enquanto, do lado de fora, caminhões e escavadeiras varam a noite à procura de um casal de namorados que se jogou numa represa. O sertão, aqui, é outro. Violento, urbanizado pela metade, que se conecta de forma precária ao mundo de consumo e às ambições das grandes cidades.
O autor volta aos temas explorados em seus outros livros, ao falar de traição, repressão, segredos e linhagens assombradas por uma herança de violência. Porém, a cada conto, a cada personagem, ele revela algo novo, sempre buscando um caminho distinto. Com originalidade e vigor, Ronaldo Correia de Brito entrelaça memória, realidade e sonho em doze histórias surpreendentes.
Sinopse: O livro traz um conto em estrutura não-linear, ambientado no Recife de hoje e, como uma marca da obra de Ronaldo Correia, expõe as tensões sociais, abordando a luta por espaços nas cidades e a violência contra a mulher. As várias narrativas que se intercalam, têm como ponto de contato o curso rio Capibaribe e uma violência cíclica, que convergem para um desfecho impactante.
Trata-se de uma edição artesanal, produzida pela editora Mariposa Cartonera, numa proposta que alia sustentabilidade e comércio justo. Cada exemplar é único, com capas de papelão reutilizado, pintadas à mão.
Sinopse: Do alto da ponte da Madalena, no Recife, Cirilo observa as águas lamacentas do Capibaribe. Está pronto para pular; é a segunda vez em quatro anos que vai até lá e, parado na borda, observa os caranguejos das margens. No entanto, algo o faz mudar de ideia. Ao perambular pelas ruas dilapidadas do centro, o leitor aos poucos passa a conhecê-lo.
Cenário de pleno regime militar, no final dos anos 1960. Recife é uma cidade violenta. Cirilo está prestes a terminar o curso de medicina, mas a opressão que sofre de colegas e professores não mudou em todos esses anos. Escreve à mãe cartas angustiadas, e seus relacionamentos na cidade são instáveis. Geraldo, o irmão mais velho, é um líder estudantil cheio de certezas e ideais; está desaparecido, e o pai, que acompanha sua trajetória à distância, recolhido na fazenda da família, espera o pior.
Cirilo deve encontrar o irmão; quer vê-lo, mas teme não ser compreendido quando se defrontarem. Ao narrar sua história, Ronaldo Correia de Brito retoma o fio de memória de Galiléia para compor um romance inovador, tanto no aspecto estilístico quanto no temporal.
Sinopse: Escrito pelo premiado autor Ronaldo Correia de Brito em parceria com o também cearense Assis Lima, a peça Baile do Menino Deus é encenada há 27 anos na época de festas no Nordeste. Em Recife, é vista por pelo menos 60mil pessoas a cada mês de dezembro. Inspirado nos autos do reisado nordestino, o enredo da peça ensina, em especial às crianças, que existe um outro Natal, bem diferente daquele que se vê em lojas e shoppings.
A história gira em torno de uma festa que vai acontecer, tendo os brincantes como personagens que seguem de casa em casa e um palhaço, Mateus, conduzindo a narrativa. Com sua estrutura simples, sem rodeios, é uma narrativa que dialoga com as emoções de todo o tipo de pessoa. Na peça de Correia de Brito e Assis Brasil, o Natal não valoriza as compras nem a comilança da festa, mas elege, como foco principal, o Menino Deus e o que ele representa, como símbolo do renascimento e da esperança.
Sinopse: Arlequim de Carnaval é uma peça teatral que mistura commedia dell’arte, teatro grego e cultura brasileira e foram musicadas por Antônio Madureira, criador do Quinteto Armorial.
Mas o verdadeiro destaque desta obra de Ronaldo Correia de Brito e Assis Lima é o carnaval recifense, com muito frevo e maracatu. O livro faz parte da Trilogia das Festas Brasileiras, que incluem Baile do Menino Deus e Bandeira de São João.
Povoado de cantigas e referências tradicionais da cultura nordestina, o livro conta a história de Arlequim, um folião abusado que brinca com o destino de todos a sua volta. Faz o patrão de palhaço, foge da esposa como o diabo da cruz, e ainda cria mil confusões no romance entre Pierrô e Colombina.
Durante os dias do carnaval, Pierrô e Colombina se apaixonam, mas não revelam um ao outro suas verdadeiras identidades, “para não quebrar o encanto”. Mas os dois amantes não resistem e pedem ajuda ao amigo Arlequim, que inventa logo uma história: diz a Pierrô que Colombina é uma rainha, e a Colombina que Pierrô é um rei. Não chega a ser uma mentira: Pierrô é o rei da dança e Colombina, a rainha de maracatu. O casal, porém, entende tudo errado e pensa viver um amor impossível, que só pode durar os três dias de carnaval.
Quando o carnaval chega ao fim, cabe ao leitor descobrir se as confusões de Arlequim conseguem unir ou separar os foliões apaixonados. Com ilustrações de Bruna Assis Brasil, Arlequim de Carnaval é um livro infantil, mas que aborda temas para todas as idades, além de ter um formato simples de peça de teatro, que pode ser encenada em qualquer lugar.
Sinopse: Depois de trabalhar a terra e plantar as sementes, nada mais alegre do que colher os frutos. As festas juninas brasileiras, principalmente no Nordeste, celebram a prosperidade e a fartura das colheitas. Bandeira de São João, de Ronaldo Correia de Brito e Assis Lima, conta, em uma narrativa simples e metafórica, a história do desaparecimento do sol, que se escondeu deixando a terra escura e triste.
O Noivo e a Noiva iam se casar à luz de uma fogueira, mas se perdem. A Boneca de Milho não amadurece em espiga e o pássaro Uanari não canta mais. Só há uma maneira de trazer a alegria de volta, realizar o casamento e dançar uma quadrilha, achando o sol. Os personagens passam por várias provas nessa busca, sem perder a coragem e o sonho.
Bandeira de São João fala de amadurecimento e dos obstáculos que cada indivíduo deve superar para viver melhor. Baseada em brincadeiras populares da região nordeste, os autores criaram uma peça teatral divertida e cheia de sabedoria, que, mesmo com a aparência infantojuvenil, é escrita para todas as idades.
Sinopse: Ronaldo Correia de Brito é uma das vozes mais originais da literatura brasileira contemporânea. Suas crônicas revelam um escritor apaixonado pela arte em todas as suas expressões. Ler sua obra é como embarcar numa viagem e se aprofundar no conhecimento sobre os costumes e a realidade do país.
Nascido no Ceará, Ronaldo faz de sua escrita um exercício de reflexão e conhecimento. Dono de um estilo franco, transita com igual desenvoltura pelas tradicionais manifestações de cultura oral e as mais distintas expressões da cultura erudita.
A excelência literária das crônicas está na fala simples, nos temas aparentemente menores, mas que reflete com singularidade sobre o mundo de hoje. Não importa de onde ele fala — se do Crato, de São Paulo de ou Paris —, Ronaldo faz literatura e ponto final. E o Brasil é tema recorrente — quando atravessa, por exemplo, a ponte Carlos, em Praga, percebe a semelhança com a cidade de Olinda, num domingo de Carnaval.
O escritor não entende o imediatismo, o consumo desmedido e supérfluo, a massificação dos gostos e opiniões. Valoriza o que é atual, mas não aceita que a ignorância do passado suprima o que de bom o homem já conquistou. Sem máscaras, é protagonista das crônicas que escreve, abordando com frequência suas lembranças e trajetórias.
Sinopse: Retratos imorais é um livro inquietante; sua primeira impressão é a do choque. Ronaldo Correia de Brito se distancia de suas obras anteriores, amplifica as tensões íntimas de Galiléia para criar uma coleção de contos cheia de fúria, de dor, que vibra com uma força criadora pouco vista na literatura brasileira.
Divididos em três seções, como a exposição de retratos numa galeria, os contos nos mostram figuras de homens e mulheres despedaçados, assombrados pela memória e pelo impacto do presente. Mãe e filho numa relação obsessiva, um garoto que sonha o grande mundo, um cirurgião que no momento crítico se sente paralisado.
Suas imagens, suas frases, seus personagens desconcertam, mas nos levam a um domínio mais profundo da literatura, que atinge a essência de cada um de nós.
Sinopse: Três primos atravessam o sertão cearense para visitar o avô Raimundo Caetano, patriarca de uma família numerosa e decadente que definha na sede da fazenda Galiléia. Ismael, Davi e Adonias passaram parte da infância ali, mas fizeram o possível para cortar seus laços com a terra de origem. Fazem parte de uma geração que largou o campo para nunca mais voltar. Foram viver no exterior, procuraram reconstruir a vida em Recife, em São Paulo, na Noruega.
O que espera os três primos ao final da viagem é uma volta radical a esta origem, a esta fazenda que um dia foi próspera, que oculta segredos e traições e “onde as pessoas se movem como nas tragédias”. Por mais que os protagonistas tenham se distanciado da violência que ronda a família, voltarão a senti-la de perto, descobrindo que nunca escaparam – ou escaparão – ao destino que os cerca. Terão de se reencontrar com a família e seus fantasmas, e reviver histórias de adultério, vingança e morte.
Livro vencedor do Prêmio São Paulo de Literatura
Sinopse: Adaptação de um dos mais famosos cordéis nordestinos e uma verdadeira proeza no âmbito da literatura infanto-juvenil. A narrativa reflete influências árabes e ibéricas que desde o século XVI alimentam o cordel, uma das mais legítimas manifestações culturais do Nordeste brasileiro. O pavão misterioso tem traços inspirados nas Mil e uma noites, de maneira semelhante a outros cordéis famosos, como A donzela Teodora e João Grilo. Na história, os ricos irmãos João e Luís ficam infelizes após a morte dos pais. Luís decide viajar pelo mundo, e, nas longínquas terras do Oriente, encontra a mulher mais bela do planeta, Creusa, encarcerada por seu pai em uma torre. Luís traz uma foto dela para o irmão, que também se apaixona e cria um plano mirabolante para libertá-la. O suspense do livro é saber como o pavão misterioso poderá ajudar João a resgatar Creusa da crueldade do pai.
Sinopse: O autor de Faca, sucesso unânime de crítica, também desta editora, apresenta agora um segundo volume de contos. O universo destas histórias é um sertão de ressonâncias existenciais, denso, de linguagem depurada, que conjuga em perfeito equilíbrio dureza e poesia. O espaço amplo, a solidão, os códigos, hábitos e constrangimentos sociais típicos do sertão dão às histórias uma austeridade digna de tragédias clássicas. Em alguns momentos, esse sopro clássico se reflete em inteligentes investigações morais, em outros, nos conflitos insolúveis entre os personagens, quando dois ou mais pontos de vista, a seu modo igualmente justos, se enfrentam até as últimas consequências. Mas Livro dos Homens marca, ainda, pela primeira vez na obra de Ronaldo Brito, o surgimento de enredos em que o imaginário sertanejo e o da cultura popular nordestina se encontram com a modernidade, como ocorre nos contos Qohélet, Cravinho e Mexicanos. Isso prova que, ao contrário do que se poderia pensar numa leitura apressada, o autor não se propõe a fazer uma releitura dos temas e da técnica regionalista. Sua literatura é inovadora, pessoal, encontrando ligações inesperados entre a força simbólica da atmosfera sertaneja e a contemporaneidade na qual todos vivemos.
Sinopse: A rica tradição da literatura nordestina é revigorada nestas histórias de amor e de morte, de vingança e paixão, de solidão e ciúme, de coragem e traições. Em suas narrativas, quase sempre de final surpreendente, o cearense Ronaldo Correia de Brito explora os valores de uma cultura onde as relações entre as pessoas são determinadas por regras secas e duras. As catorze xilogravuras da artista Tita do Rêgo Silva, feitas especialmente para a edição, enfatizam o poder imagético dessa prosa.
Esse é o meu primeiro livro. Ao lado dos contistas Rafael Rocha Neto, José Teles e Maria das Dores Cavalcanti, que também ganharam o prêmio, publico uma coletânea de três narrativas com o título de Três histórias na noite. O livro é prefaciado pelo jornalista Ronildo Maia Leite.
Prêmio Novos Ficcionistas Pernambucanos
Com essa comédia, Assis Lima e eu encerramos a Trilogia das Festas Brasileiras, composta junto com Baile do Menino Deus e Bandeira de São João. Os trabalhos consistiam na escrita de um texto teatral, a encenação do mesmo e um disco com as músicas do espetáculo. O livro foi publicado pela Companhia Editora de Pernambuco – Cepe –, com capa de Romero Andrade Lima e orelha escrita pelo dramaturgo Rubem Rocha Filho.
Prêmio Hermilo Borba Filho, Governo do Estado de PE
O espetáculo e o disco Baile do Menino Deus já tinham 12 anos de trajetória, quando escrevemos essa adaptação para prosa, publicada pela Editora Bagaço, com ilustrações de Rosinha. A Bagaço fez um ótimo trabalho de divulgação e venda do livro, em todo nordeste, durante mais de 10 anos. As encenações se multiplicaram por todo o Brasil, tornando o texto e a música de domínio público com autores vivos.
É na Editora Bagaço que eu faço a minha estreia com um livro de contos. São 12 narrativas apresentadas por Mario Hélio, e capa bem simples, em que se reproduzem detalhes da gravura a Queda do Anjo, de Gilvan Samico. Graças a essa edição fui lido por Davi Arrigucci Jr., que me convidou para publicar na CosacNaify, com os editores Augusto Massi e Rodrigo Lacerda. Os contos de As noites e os dias foram reescritos e republicados em Faca, Livro dos homens e Retratos imorais.
Da mesma maneira que havíamos feito com o Baile do Menino Deus, adaptamos a forma teatral de Bandeira de São João em prosa, e publicamos pela Editora Bagaço, com ilustrações de Rosinha. O livro foi um grande sucesso de vendas e encenações. Contribuiu para isso, a gravação em disco das músicas do espetáculo, pelo selo Eldorado.
Outro êxito da Bagaço, a edição em prosa do texto teatral, ilustrada por Rosinha. Terceiro e última produção da Trilogia das Festas Brasileiras, seguiu a mesma trajetória dos dois primeiros, ganhando inúmeras encenações e prêmios.
O livro faz parte de uma coleção organizada por Ruth Rocha, com mais quatro livros, todos editados pela Objetiva para o Programa Nacional Biblioteca da Escola. Da coleção fazem parte autores famosos. Ela foi selecionada para compra, vendendo quase meio milhão de exemplares. Os livrinhos são modestamente editados, para se tornarem baratos e populares. Mas, graças a esta aquisição do Ministério da Educação, o Baile tornou-se conhecido e muito encenado em todo Brasil. As ilustrações são de Pinky Wainer e o texto de apresentação de Ruth Rocha.
Peça editada para o mesmo Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE), pela editora Objetiva, com ilustrações de Glenda Rubinstein
Também editada para o Programa Nacional Biblioteca da Escola, pela editora Objetiva, com ilustrações de Glenda Rubinstein. A partir dessa edição, Assis Lima e eu passamos a chamar a peça de Arlequim de Carnaval, para não se confundir com vários outros textos mais famosos, com o título Arlequim.
Como surgiu seu gosto pela literatura, já que sua formação é na área da saúde? Foi fácil criar essa ponte entre as carreiras de médico e escritor?
R – Meu gosto pela literatura é anterior à decisão de estudar medicina. Desde criança gostava de ler e escrevia peças de teatro para a escola. A medicina, por ser uma profissão humanista, que lida de perto com a dor e a alegria do homem, foi uma escolha natural, a que mais se aproximava do meu interesse pelas artes.
A medicina, de alguma maneira, influencia sua literatura? Como concilia as duas carreiras?
R – Sim, influencia bastante. Como o russo Tchekhov, tenho personagens médicos e pacientes e histórias que se passam no ambiente hospitalar. Transito facilmente do exercício da medicina para a escrita.
O senhor já disse que por muito tempo relutou em publicar seus livros, pois achava que já existiam muitos livros no mundo. Como mudou de ideia?
R – Mesmo pensando dessa maneira, eu escrevia bastante. E quem escreve com disciplina, um dia deseja publicar seus escritos. Eu terminei caindo nesta cilada.
Logo na infância, quando ainda vivia no sertão, o senhor já se ocupava em escrever cartas para pessoas que não eram alfabetizadas à la “Central do Brasil”. Até que ponto esse tipo de atividade influenciou sua formação educacional?
R – Escrever cartas é uma maneira de fazer literatura. Boa parte da obra de Balzac se compõe de cartas. Acho que minha iniciação com a escrita se faz através dessas cartas que eu escrevia para as pessoas comuns, analfabetas, mas que tinham uma história para narrar e sabiam narrá-la bem, através dos recursos da oralidade.
Em sua biografia percebemos uma grande paixão pela leitura, maior até mesmo do que a vontade de escrever. Existe algum conflito entre essas duas atividades?
R – Na vida de um escritor não pode existir conflito entre o gosto de ler e o de escrever. Não existe bom escritor que não seja excelente leitor. Às vezes gostaria de ocupar-me mais com a leitura do que com a escrita. É um desejo natural de quem passou boa parte da vida lendo.
Ainda na adolescência o senhor teve contato com muitas obras importantes e, certamente, isso influenciou sua vontade de escrever. Nos dias de hoje, em que o acesso às informações é facilitado pela tecnologia, por que a taxa de leitura no Brasil ainda é tão baixa?
R – Vivemos um tempo em que os livros de papel perderam espaço para outras formas de comunicação. As pessoas preferem as redes sociais, a TV, o cinema, o telefone celular, a tela de um computador. Isso não é apenas no Brasil. Com os alunos da Sorbonne acontece a mesma coisa. Aqui no Brasil, nós saltamos o tempo do prestígio do livro e do ato de ler, porque nossa sociedade era muito pobre e na maioria analfabeta. Entramos na era tecnológica sem termos vivenciado a plenitude dos livros e da leitura. Teremos de inventar um caminho próprio para motivar nossas crianças e jovens a gostar de ler.
Sempre foi muito comum no sertão a tradição da narrativa oral. Ainda hoje esse traço continua muito presente na vida dos nordestinos?
R – Era bem mais forte na minha infância. Havia narradores profissionais, parecidos com o Griot da África Ocidental, que preservavam as histórias orais das tribos e vilas. Mas eu acho que a necessidade de narrar continua muito forte, como um traço formador do homem. Não podemos viver sem contar e ouvir histórias.
O senhor realizou um longo trabalho de estudos e resgate da cultura popular nordestina. Acredita que ela ainda esteja bem viva no cotidiano da população ou foi se dissolvendo com o passar do tempo?
R – Algumas tradições desapareceram como os rituais de encomendar os mortos com cantos fúnebres. O teatro popular – reisado, lapinha, boi de reis, etc. – se enfraqueceu bastante, porque ele era ligado às comunidades agrárias ou a corporações de ofício, e essas também quase desapareceram. O que era cultura popular viva transformou-se em folclore, que possui significado diferente.
Como foi conviver em Recife, ainda tão jovem, com intelectuais como Ariano Suassuna, Ângelo Monteiro e Marcus Accioly?
R – Essa pergunta eu também me faço. Como esses intelectuais aceitavam a convivência de um fedelho de olhos arregalados, ouvindo e prestando atenção em tudo? Fui aluno de universidades informais, como a dos artistas populares, e achei que nelas aprendi bem mais do que no ensino formal.
As peças ‘Baile do Menino Deus’, ‘Bandeira de São João’ e ‘Arlequim’ mostram outro lado do senhor como escritor. Como foram essas experiências?
R – Eu acrescentaria ‘O Pavão Misterioso’. Essas peças, que foram e são encenadas inúmeras vezes, tiveram a música gravada em disco, os textos dramáticos e as adaptações em prosa editados, são uma parceira com o poeta Assis Lima e o músico Antonio Madureira. Nessas quatro obras, trabalhamos com os materiais de nossas pesquisas em cultura popular, e acho tudo bem afinado com o restante da minha produção.
Nos filmes ‘O Cavaleiro Reisado’ e ‘Lua Cambará’, o senhor atuou como diretor. Pensa em trabalhar com cinema novamente?
R – No papel de diretor, não. Gosto de ceder textos para adaptações e posso até ajudar na concepção dos roteiros. Mas, fico por aí mesmo.
Alguns de seus contos como “Duas Mulheres em Preto e Branco” e “Lua Cambará” já foram adaptados para o cinema e o teatro. O senhor credita essas adaptações a alguma característica específica de sua construção narrativa? As adaptações o agradaram?
R – Gosto da primeira adaptação do ‘Lua Cambará’ para cinema, em super 8, o primeiro e único longa nessa bitola. Gostei muito da direção de Moacir Chaves para ‘Duas Mulheres em Preto e Branco’ – o filme baseado nesse conto ainda não saiu. Como vi muito cinema, é possível que minha escrita tenha afinidades com essa linguagem.
Seu primeiro livro, ‘Três Histórias na Noite’, foi lançado em 1989 e desde então o senhor já publicou contos, ficção e romance. Tem preferência por algum estilo?
R – Acho que escrevo contos com facilidade. O romance é bem mais cansativo, porém não tenho preferências, transito pela crônica, o ensaio e o teatro, da mesma maneira.
Sua estreia como romancista foi com a publicação ‘Galileia’, o que também marcou uma grande reviravolta em sua carreira. Por quais motivos o senhor acha que esse livro é considerado um marco?
R – Creio que lancei um olhar novo sobre o sertão. Tínhamos ‘O Sertanejo’ de José de Alencar, com sua visão romântica. E ‘Os Sertões’ de Euclides; ‘Grande Sertão: Veredas’ de Guimarães – poético e metafísico; ‘O Romance da Pedra do Reino’, de Ariano, narrativa épica e mítica; o sertão de Raquel de Queiroz e Graciliano Ramos, com certo grau de denúncia social. Galileia reinventa o tema, falando de um sertão em ruínas, transformado em periferia urbana.
Em ‘Estive lá Fora’ o período da ditadura militar é, de certa forma, retratado. Como foi criar uma mistura entre a ficção e a realidade?
R – Acho que durante o processo da escrita transformamos o discurso em romance e a história reescreve a história.
O senhor chegou a participar de algum movimento contra a ditadura? Quais suas recordações desse período?
R – Eu nunca me filiei a nenhum partido, isso era contra os meus princípios de liberdade. Mas as minhas atitudes perante a vida e as minhas ações eram assumidamente contra a ditadura militar.
É possível traçar alguma comparação entre os irmãos Geraldo e Cirilo, de ‘Estive lá Fora’, com o jovem Ronaldo que chegou ao Recife na década de 60?
R – Sim, há muitos pontos em comum. As biografias dos escritores terminam se confundindo um pouco com a dos seus personagens.
Podemos entender que os contos de ‘Livros dos Homens’ nos guiam em direção a um melhor entendimento sobre o comportamento humano?
R – Todos os meus escritos buscam esse entendimento. Se eu não o alcanço, necessito melhorar como escritor.
Como foi o seu trabalho como escritor-residente da Universidade de Berkeley, Califórnia?
R – Um escritor residente recebe os alunos que estudam sua obra, dá uma conferência e faz a leitura de um texto seu na biblioteca do Departamento. No meu caso, também fui pra sala de aula.
Quais são os livros ou autores que não podem faltar em sua mesa de cabeceira?
R – Eles variaram muito, ao longo dos anos. Alguns, nunca deixaram de estar por perto: Borges, Whitman, Tchekhov, Dostoievski, Guimarães Rosa, a Bíblia, As Mil e Uma Noites, O Mahabharata.
O senhor tem predileção por autores russos clássicos como Tolstoi e Dostoievski. O senhor costuma ler algo contemporâneo também?
R – Mais da metade do que leio, atualmente, são escritores contemporâneos, sobretudo os brasileiros.
Por conta de algumas características gerais muitos autores passam a ser conhecidos como regionalistas. Por que o senhor dispensa esse título?
R – Eu não dispenso que me vinculem ao meu lugar de origem, à minha paisagem, ao meu mundo. Dispenso que me filiem ao Romance de 30, ao Movimento Regionalista criado por Gilberto Freyre, em 1926. Com este, não tenho nada a ver.
O senhor já participou de eventos no exterior, como Feira do Livro de Leipzig, Salão do Livro de Paris, Feira de Frankfurt, e lançou o livro de contos ‘Faca’ em francês. Qual é a importância da divulgação da literatura brasileira em outros países?
R – Da mesma maneira que o mercado editorial brasileiro se abre à publicação de tudo o que é editado nos outros países, também precisamos colocar nossa literatura lá fora. Isso não é fácil. No momento lutamos para convencer as pessoas e os outros mercados de que essa literatura existe, de que não somos apenas o país do futebol e das mulatas.
Qual é a importância da literatura e de eventos como as Feiras de Livros na formação de crianças e jovens?
R – O Brasil precisa superar o analfabetismo real e funcional. Nós seremos um grande país no dia que tivermos uma boa educação, de amplo alcance. A literatura é fundamental nisso. Os Eventos literários ajudam a divulgar os livros e a aproximar autores de leitores comuns, acabar com o glamour da literatura, mostrando-a como um ofício.
O senhor tem algum conselho para dar aos jovens escritores, principalmente àqueles que também conciliam a carreira com outras profissões?
R – Leiam muito.
Quais são os seus próximos planos literários?
R – Trabalho um novo romance e um novo livro de contos.