js_composer
domain was triggered too early. This is usually an indicator for some code in the plugin or theme running too early. Translations should be loaded at the init
action or later. Please see Debugging in WordPress for more information. (This message was added in version 6.7.0.) in /home1/ronaldoc/public_html/site2/wp-includes/functions.php on line 6121bridge
foi ativado muito cedo. Isso geralmente é um indicador de que algum código no plugin ou tema está sendo executado muito cedo. As traduções devem ser carregadas na ação init
ou mais tarde. Leia como Depurar o WordPress para mais informações. (Esta mensagem foi adicionada na versão 6.7.0.) in /home1/ronaldoc/public_html/site2/wp-includes/functions.php on line 6121Um amigo baleado por assaltantes foi socorrido na emerg\u00eancia do Hospital da Restaura\u00e7\u00e3o. Como sou m\u00e9dico, os familiares ligaram para mim, pedindo que eu fosse v\u00ea-lo. Cheguei r\u00e1pido, mas todas as provid\u00eancias j\u00e1 haviam sido tomadas: exame cl\u00ednico, radiografias, medica\u00e7\u00e3o, curativos. A bala passou ao lado de art\u00e9rias e v\u00edsceras, mas, felizmente, saiu sem causar maiores estragos. <\/span><\/p>\n Afirmam que o melhor lugar para socorrer traumatizados \u00e9 uma emerg\u00eancia de hospital p\u00fablico, embora todas pare\u00e7am uma pra\u00e7a de guerra. Boxes e corredores est\u00e3o cheios de macas, colch\u00f5es e papel\u00f5es servindo de camas. Os pacientes e familiares se amontoam esperando a evolu\u00e7\u00e3o da doen\u00e7a, exames complementares, cirurgia ou transfer\u00eancia para outro hospital. Gritos, gemidos, mau cheiro, desconforto e l\u00e2mpadas acesas no rosto criam a sensa\u00e7\u00e3o de uma c\u00e2mara de tortura. Alguns permanecem muitos dias nesse ambiente insalubre, e ao sa\u00edrem ficam transtornados, em surto psic\u00f3tico. <\/span><\/p>\n N\u00e3o s\u00e3o apenas os pacientes que sofrem. M\u00e9dicos, enfermeiras e t\u00e9cnicos, por mais habituados que estejam ao conv\u00edvio com a dor, trabalham no limite do stress. As estat\u00edsticas mostram \u00edndices elevados\u00a0 <\/span>de alcoolismo, uso de drogas, doen\u00e7as psiqui\u00e1tricas e suic\u00eddio entre os m\u00e9dicos, em conseq\u00fc\u00eancia de jornadas de trabalho excessivas, p\u00e9ssima remunera\u00e7\u00e3o e frustra\u00e7\u00f5es com o exerc\u00edcio da profiss\u00e3o. Bastam algumas horas dentro de uma emerg\u00eancia geral para constatar a dura realidade. <\/span><\/p>\n Admiro os m\u00e9dicos que d\u00e3o o m\u00e1ximo de si mesmos para minorar a dor dos que sofrem. H\u00e1 neles uma humanidade semelhante \u00e0 dos her\u00f3is que desprezam o perigo, arriscando a vida para salvar o semelhante. Mas, a medicina praticada pela maioria dos m\u00e9dicos sofre de um orgulho desmedido, uma f\u00e9 excessiva na t\u00e9cnica. N\u00e3o farei ataques \u00e0 raz\u00e3o e \u00e0 t\u00e9cnica. T\u00e9cnica para mim continua sendo t\u00e9chnik\u00f3s<\/i>, que significa relativo \u00e0 arte. <\/span><\/p>\n Questiono o modelo de medicina baseado numa raz\u00e3o infal\u00edvel, que subestima a \u00e9tica, a cultura e a subjetividade do paciente. No trato com as popula\u00e7\u00f5es mais pobres, a medicina lembra os colonizadores que invadem na\u00e7\u00f5es, consideram os povos dominados inferiores, rejeitam sua cultura, os valores sedimentados durante s\u00e9culos. No Brasil, somos formados por v\u00e1rios estratos de civiliza\u00e7\u00e3o e cultura, alguns povos ainda vivem no neol\u00edtico, como os \u00edndios Ianom\u00e2mis. <\/span><\/p>\n Existe uma maneira de substituir o som do marac\u00e1 numa pajelan\u00e7a, pelo ru\u00eddo do aparelho de resson\u00e2ncia magn\u00e9tica, sem causar perdas? Trocar uma magia por outra, sem afirmar a supremacia do nosso conhecimento, o poder da medicina contra a fuma\u00e7a do cachimbo do paj\u00e9. Para isso falta-nos humildade. E somos castigados pela hybris<\/i>, a arrog\u00e2ncia do saber absoluto. Ao mesmo tempo em que avan\u00e7amos nas mais sofisticadas tecnologias de investiga\u00e7\u00e3o e tratamento, nosso povo sofre os males do subdesenvolvimento: fome, viol\u00eancia, analfabetismo e doen\u00e7as de veicula\u00e7\u00e3o h\u00eddrica, pela aus\u00eancia de saneamento b\u00e1sico. <\/span><\/p>\n O culto ao diagn\u00f3stico tornou-se uma obsess\u00e3o. Interessa agir como um detetive, revirar as entranhas de quem sofre, chegar a um dos n\u00fameros do C\u00f3digo Internacional de Doen\u00e7as. \u00c9 a l\u00f3gica cient\u00edfica, quase sempre absurda. Como no relato de Jean-Claude Carri\u00e8re, em O C\u00edrculo dos Mentirosos<\/i>.<\/span><\/p>\n Um cientista examina uma pulga que veio se instalar perto dele. Ele lhe ordena: \u201cPule!\u201d, e a pulga pula. O cientista escreve numa folha de papel: \u201cQuando dizemos a uma pulga para pular, ela pula\u201d. Ent\u00e3o, ele pega a pulga e arranca, cuidadosamente, as suas patas. Coloca-a perto dele e ordena: \u201cPule!\u201d. A pulga n\u00e3o se mexe. O cientista anota na folha de papel: \u201cQuando arrancamos as patas de uma pulga, ela fica surda\u201d.<\/p>\n <\/span><\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":" Um amigo baleado por assaltantes foi socorrido na emerg\u00eancia do Hospital da Restaura\u00e7\u00e3o. Como sou m\u00e9dico, os familiares ligaram para mim, pedindo que eu fosse v\u00ea-lo. Cheguei r\u00e1pido, mas todas as provid\u00eancias j\u00e1 haviam sido tomadas: exame cl\u00ednico, radiografias, medica\u00e7\u00e3o, curativos. 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